sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Alma brava


Comparar filmes é uma das mais cruéis tarefas para um cinéfilo. Ainda mais quando as películas em questão envolvem questões emocionais fortes. Tem coisa pior do que ficar dividida entre a lógica da linguagem cinematográfica e o coração que puxa a cordinha pro lado contrário? Enfim, é difícil, mas não impossível. Avante!
Assisti a primeira versão de Bravura Indômita quando tinha 15 anos. Era uma menina descobrindo John Wayne e, até então, achava aquele grandalhão americano um péssimo ator que tinha uma ótima cara de cowboy. Só que havia chegado a hora de conhecer o filme que deu a ele o único Oscar de sua longa e recheada (mais de 200 longas!) carreira. Confesso que entendi plenamente porque a Academia se rendeu ao jeito turrão de Duke*. Ele é a alma do filme e não existe maior dádiva para um ator do que ser a alma de um filme. Protagonizar é uma coisa, você é praticamente obrigado a carregar o filme nas costas. Mas ser a alma é algo que acontece, uma magia que só se concretiza na tela grande. O ator pode estar em apenas uma cena, mas se ele for a alma do filme, será dessa cena que todos vão lembrar.
Tanto na versão de 1969 como na atual, conduzida com maestria pelos irmãos Coen, a história é mostrada através do olhar da menina enfezada Mattie Ross, que contrata um xerife chegado num whisky para ajudá-la na busca pelo assassino de seu pai. No filme dirigido por Henry Hathaway(responsável por outro grande faroeste, Os filhos de Katie Elder), Mattie é vivida pela insossa Kim Darby, que exagera nos trejeitos e no sotaque, criando uma protagonista romântica demais para um faroeste.

E parece que os Coen também se sentiram incomodados com o fato de um filme tão raro no universo western como Bravura Indômita, ter uma protagonista tão fraca. Prova disso foi a decisão de colocar o sempre impagável Jeff Bridges no papel que foi de Wayne, conferindo um charme que este não tinha. Com um xerife de primeira linha garantido, lá vamos nós procurar uma garota esperta para dar vida a Mattie Ross. Eis que cruza o caminho da dupla a linda Hailee Steinfeld. Com apenas 14 anos, Haille transmite uma segurança na tela digna de uma veterana. Há verdade em cada fala, em cada cena. Haille é Mattie Ross. Mesmo em momentos de maior emoção, como na despedida do Texas Ranger LaBoeuf, vivido por Matt Damon, onde corre-se o risco de desbancar para o lado da pieguice, Haille segura as pontas.

Não posso negar que tenho um carinho todo especial com o Bravura de 1969. Foi um dos primeiros integrantes da lista de filmes que me fizeram correr atrás dessa paixão chamada faroeste. Mas os Coen são danados e conseguiram fazer um filme no ponto certo. E mais: trouxeram a poeira do oeste para o Oscar, lugar que ele frequentou poucas vezes. Um paradoxo, já que essa é, ao lado do jazz, a mais americana das artes. E olha que quem disse isso foi o Clint Eastwood!

Haille é a alma do Bravura de 2010. Que o talento dela leve as pessoas até as salas de exibição para o, talvez, primeiro faroeste de suas vidas. Pode crer: a gente nunca esquece.

Bjus da Bia, bang-bang

*Duke era o apelido que John Wayne ganhou no tempo que fazia média-metragens para a produtora de filmes B Republic.

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